"Sopeirar"

O termo é da minha amiga Maria Inês e é um "all in one". Isto porque "sopeirar" é tudo aquilo a que nós nos podemos dedicar no interior do nosso lar... Ele é cozinhar, é fazer máquinas de loiça e roupa, é passar essa roupa toda, é aspirar, é limpar, é lavar, é fazer camas, é fazer reciclagens e tratar desses caixotes todos, é pregar botões ou coser roupas que precisem de um reparo... Enfim... É toda aquela infinidade de coisas que existem para tratar numa casa de família.
Desde pequena que sempre fui ajudando no que era preciso em casa, mas nada de especial.. Andava mais por ali a cirandar, a ver a minha avó cozinhar, fazer arraiolos, coser.... Basicamente limitava-me a estender roupa no nosso grande terraço (que eu adorava) e a ajudar a minha mãe a fazer limpeza quando ela decretava que era dia para tal. 
Mais tarde, na faculdade, a partilhar casa com amigas e primas, também não era grande o trabalho... Fazíamos sempre a limpeza "à vez" e como erámos cinco, não nos calhava assim tantas vezes esse trabalho. Quanto às refeições, vinha carregadinha de marmitas de Santarém e para passar a roupa dava uma sacudidela ali, uma passagem aqui e já estava.
Quando fui viver com o meu amor maior, as coisas também eram mais pró "relax"... Só tinha que fazer a limpeza da casa, mas como o nosso primeiro lar no Príncipe Real ficava-se por uns módicos 32 m2 (!!), não era nada que me incomodasse muito. Quanto às refeições, nada de cozinhar, apenas uma sopita ou outra, porque na maior parte do tempo andávamos sempre por aqui, por ali, com o amigo, com a avó, com a mãe... e as roupas mandávamos passar a uma lavandaria. 
A verdade é que nunca fui muito amiga destas tarefas... Tinha um sem número de coisas mais divertidas para fazer!
Mas quando fui mamã, a coisa teve obviamente que mudar o seu rumo... Ao príncipio foi difícil de me habituar: quilos e quilos de roupa para lavar, estender, passar, comidas e menus variados todos pos dias para uma alimentação equilibrada, a limpeza da casa, and so on, and so on... Por Lisboa,  tinha a "Fada Margarida", que ía lá a casa cinco horas por semana e era vê-la passar pilhas de roupa em quatro horas e na hora que faltava ainda dava um "jeitinho" à casa... Mas em Bruxelas, a Fada chama-se mesmo Rita.  E sou mesmo uma Fada, estou uma "expert" em "faire le ménage", para pôr a coisa mais fina!
O ser humano é espectacular, adapta-se de uma maneira incrível às mudanças que lhe vão surgindo na vida. Ao principío estranha-se, mas depois entranha-se. Agora até dou por mim a gostar dos momentos em que estou a passar a ferro, até acho que são um pouco terapêuticos... E se antigamente me ficava apenas pelos cozidos e grelhados na cozinha, para despachar e porque também na verdade é mais saudável, agora, desde que estamos em Bruxelas e que não temos a família para pedirmos para fazerem os melhores pitéus, tenho que me fazer à vida e tratar de fazer os pratos mais elaborados (sempre fui uma miúda de grandes vontades e desejos gastronómicos). A verdade é que estou a ficar uma autêntica "Master Chef", modéstia à parte, que eu também sou uma apreciadora exigente.
Neste "ram, ram" doméstico lembro-me vezes sem conta da minha avó. Vão-se desfiando na minha memória todos os anos em que cirandei à sua volta e dos seus conselhos e  técnicas na lide doméstica e não só. Em tudo. " As camisas começam sempre a passar-se pelas mangas...", "Para recuperares os atilhos de umas calças, é só pores um alfinete de ama numa ponta, que ele serve-te de guia até chegares ao outro lado"... A técnica certa para cozer um botão, para casear, todos os detalhes da cozinha mais pormenorizada e um sem número de coisas que vou recuperando e aplicando no que faço. 
Não posso deixar de achar que o meu curso também me ajuda nestas tarefas. A sério. Até a ser mamã acho que o curso que tirei me ajuda todos os dias. Eu não acertei em cheio no curso que tirei, mas com certeza que foi um grande curso o que eu tirei. Deu-me uma ginástica, limpeza de raciocínio e desenrascanço que são úteis em tudo na vida. 

1 comentário:

Sandra Lopes disse...

Uma das coisas que faz sentir que os meus avós continuam vivos é este prolongar dos seus ensinamentos - que tão bem referes - e que são heranças inestimáveis.

De quando em vez dou por mim e recordar esta ou aquela maneira de fazer no quotidiano, os gestos associados, os momentos específicos de uma dada altura do ano. Chamo a este fenómeno juntar "peças-memória".
Passo a explicar: Vimos vezes sem contar repetir certos gestos e frases. Em casa. Nas compras. Nos estudos. Na gestão das relações familiares.
Anos mais tarde, há que desenvolver as mesmíssimas tarefas ancestrais que as mulheres sempre fizeram, e devagar, mas distintamente, há "peças-memória" que ocupam o seu lugar.
Ahh, Então era por isto! Ahhh, realmente assim funciona melhor! Ahh, ainda bem que sabia fazer isto!

As casas habitadas sempre com alguém em casa, que espera por nós.

Assim, estas vozes atravessam os tempos: acompanham-nos, cúmplices.
Torna-nos mais acesos o que deles em nós permanece vivo.